quinta-feira, 9 de julho de 2009

no ônibus

"não se anda por onde gosta, mas por aqui não tem jeito, todo mundo se encosta..."

era 19h30, rostos cansados, o desânimo era nítido. era uma sexta-feira. todos queriam chegar o mais rápido possível em casa e tirar o sapato que apertava o calo.
mas eu olhei para ela. e passei a viagem inteira a observá-la. ela já tinha seus trinta e poucos anos. formada em inglês, mas hoje faz outro curso com perspectivas financeiras melhores para o seu futuro. ela é solteira, não namora. e sente-se muita solitária. não tem muitas amigas, nem amigos. não gosta de sair. talvez seja o patinho feio da família. aprendeu com o casamento do seus pais que mulher não pode depender de homem. assim cuidou em seus estudos e esqueceu do seu lado afetivo. bem sucedida profissionalmente, mas não em termos de $$. e isso de uma certa forma a incomodava. todas as suas irmãs casaram. hoje são felizes, tem filhos e prosperaram economicamente na profissão, mesmo começando tardiamente. e ela ainda ralava muito, enfrentando esse ônibus lotado.
o que me chamou atenção nela foram o seus movimentos no corredor do ônibus. no meio de todo aquele sufoco, ela ainda teve astúcia para fazer um pequeno jogo de sedução. e eu, pude assistir a tudo de camarote. ela se aproximou lentamente de um homem e logo comentou sobre a lotação do ônibus. era o início da longa conversa que duraria toda aquela viagem. eles conversavam coisas simples, sobre trabalho. ela procurava um assunto em comum, procurava afinidades. ele, tambem, entendeu. e deixou-se levar pela conversa.
mas era o olhar dela que chamava atenção... ela olhava para ele e parecia pedir ajuda... como se quisesse que ele a arrancasse dali e voasse junto com ela. queria sentir o amor que nunca experimentou. ela se encostava nele e sorria. ele tinha intenções, mas não as mesmas. as deles eram mais maliciosas, e ela era ingênua. ele era casado. e ela descobriria isso depois. mas não adiantaria mais, ela já tinha se entregado aquele homem do ônibus como se fosse a sua ultima chance.
se antes ela chorava por não ter um amor, talvez me pareça que o sofrimento terá outro motivo. eu queria avisá-la, mas não podia quebrar aquela cena.
foi quando ela olhou pra mim, e percebeu que eu sabia de tudo. envergonhou-se, afastou-se dele, pronunciou poucas palavras. a conversa meio que se encerrara.
mas ela teria outros ônibus. e desta vez eu não estaria lá para atrapalhar.
eu havia me atrasado, e só por isso peguei aquele ônibus.

2 comentários:

j.qualquercoisa disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
j.qualquercoisa disse...

é bom te ler novamente, meu amigo. é engraçado quando a gente deixa de ser expectador pra virar personagem!

continue respirando esse amor...

abraços